Arquivo para julho \31\-03:00 2012

“O assédio moral foi devastador em minha vida”, diz Hélio Oliveira, empregado da Petrobras há 30 anos

Entrevista originalmente publicada no Blog “De Olho no Discurso”

É lamentável, mas são cada vez mais comuns – ou cada vez mais conhecidos -, os casos e situações em que trabalhadores sofrem consequências profissionais, pessoais e mesmo sérios problemas de saúde devido àquilo que se convencionou chamar de assédio moral – mas que alguns preferem classificar como violência simbólica no ambiente de trabalho.
Na maior empresa do país, a Petrobras, os casos também são frequentes. Trabalhadores e trabalhadoras que sofrem consequências pessoais e até casos graves de saúde debilitada devido ao assédio de seus superiores.
É essa a história de Hélio Oliveira da Silva, 58 anos e trinta de Petrobras.  Filho de família pobre, cuja pai era carteiro, seu sonho era ser médico.  Mas, aos dezoito anos, passou no concurso para a Petrobras.  “A proposta salarial era irrecusável”, diz Hélio. O sonho de ser médico foi adiado em troca de uma carreira como técnico de perfuração e poços. “Como Técnico de Perfuração e Poços Sênior, atuo na complexa atividade de Pescaria, Teste de Formação e Testemunhagem, atividades essas desenvolvidas sempre em campo, junto a sondas de perfuração e produção, terrestres e marítimas”, explica. “Sou um técnico multidisciplinar”, conclui.
Hélio trabalha atualmente na gerência setorial de Serviços Especiais, na gerência geral de Construção de Poços Terrestres, em Mossoró.  Ele é uma das vítimas de maior dramaticidade do assédio moral na Petrobras.
O que é assédio moral?
Segundo explicação do site Assédio Moral no Trabalho, a prática é “a exposição dos trabalhadores e trabalhadoras a situações humilhantes e constrangedoras,repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções, sendo mais comuns em relações hierárquicas autoritárias e assimétricas, em que predominam condutas negativas, relações desumanas e aéticas de longa duração, de um ou mais chefes dirigida a um ou mais subordinado(s), desestabilizando a relação da vítima com o ambiente de trabalho e a organização,forçando-o a desistir do emprego”.
O assédio moral pode ser caracterizado pela “degradação deliberada das condições de trabalho em que prevalecem atitudes e condutas negativas dos chefes em relação a seus subordinados, constituindo uma experiência subjetiva que acarreta prejuízos práticos e emocionais para o trabalhador e a organização”. Entre outras atitudes, a vítima de assédio passa a ser isolada do restante do grupo, hostilizada, ridicularizada, desacreditada entre seus pares.
O assédio é uma violência que causa “danos à saúde física e mental, não somente daquele que é excluído, mas de todo o coletivo que testemunha esses atos”. Diz o texto, também, que uma pesquisa da Organização Internacional do Trabalho (OIT) em países desenvolvidos aponta para distúrbios da saúde mental relacionado às condições de trabalho em países como Finlândia, Alemanha, Reino Unido, Polônia e Estados Unidos. Segundo a OIT, no futuro, como resultado das práticas de assédio nas organizações, predominarão como doenças que acometem os trabalhadores as depressões, angústias e outros danos psíquicos.
Essa é a história de Hélio, que aceitou conversar com o blog.  Leia sua entrevista a seguir.

 

Há quanto tempo você trabalha na Petrobras? 

Antes de tudo agradeço-lhe a oportunidade, pois falar do problema, ser ouvido é uma forma de aliviar a intensidade dos meus sofrimentos. Trabalho há exatos trinta anos, cinco meses e vinte dias. À época, já tinha metas de vida estabelecida. A principal? Ser Médico. De família pobre, filho de carteiro, com doze irmãos. Passei no concurso da Petrobras aos 18 anos, a proposta salarial era irrecusável. Adiei o meu sonho, mesmo assim trabalhei na companhia com esmero e indiscutível dedicação o que me proporcionou uma carreira vitoriosa. 

Qual o seu cargo? 

Técnico de Perfuração e Poços Sênior. Como Técnico de Perfuração e Poços Sênior, atuo na complexa atividade de Pescaria, Teste de Formação e Testemunhagem, atividades essas desenvolvidas sempre em campo, junto a sondas de perfuração e produção, terrestres e marítimas. Sou um técnico multidisciplinar. 

Você é reconhecido pela especialidade em uma atividade relacionada à perfuração e a completação de poços. Explique para o leitor, em rápidas palavras, o que é completação de poços e qual a atividade em que você se destaca. O que sua expertise possibilitou a você no âmbito da empresa? 

A execução de um poço de petróleo passa por duas grandes etapas, obviamente a primeira é a perfuração do poço propriamente dito; e a segunda a completação. Em ambas as etapas surgem a necessidade de serviços especiais. Por exemplo: O poço precisa ser avaliado quanto a sua capacidade de produção (vazão) quer de forma quantitativa, quanto qualitativa. Nas duas etapas, imprevistos podem ocorrer, ou seja, as ferramentas que são descidas no poço podem quebrar, por diversos motivos podem tornar-se presas ou ainda caírem no poço. Quando isto acontece inicia-se um trabalho especial chamado pescaria, a depender da complexidade do problema uma situação desta pode demorar vários dias e alguns casos meses, para isto o especialista tem que ser detentor de um conhecimento holístico e possuir paciência e grande experiência para solucionar a questão, via de regra esses serviços são potencialmente muito perigosos. Sou funcionário laureado da empresa, tendo recebido grande homenagem no ano de 2000 por ter salvado um poço de altíssimo custo, estratégico e de importância relevante para os negócios da companhia. Após a empresa ter instituído no ano de 2001 o prêmio “Destaque do Ano”, para o empregado que prestasse serviços mais relevantes para a companhia, fui agraciado com o prêmio Destaque 2002, constando na certificação: “A Hélio Oliveira da Silva, em reconhecimento pela disseminação de conhecimentos na área de operações de pescaria, contribuindo para formação e aprimoramento da equipe de serviços especiais.” Quanto ao Know how, expertise, que possuo posso dizer quer solucionar um problema que envolve investimentos de milhões de dólares, do contrário pode significar a perda do poço e de todo dinheiro investido, é como fazer um gol de placa aos 45 min. do 2º tempo, há uma alegria e um clima de êxtase. Trabalhar na Petrobras é ter experiência que nos proporciona um grande patrimônio, não me refiro ao material e sim ao imaterial, já que, não tenho dúvidas e sem demérito a outras empresas, a inteligência brasileira gravita em torno da empresa, há muita gente inteligente e competente trabalhando nela. Razão pela qual a Petrobras é uma companhia vencedora, eu recomendo a qualquer jovem que se esforce para fazer de sua equipe. O meu caso de dor e sofrimento é pontual e em nada diminui a empresa, são distorções que ocorrem em qualquer grande instituição, mas que precisam ser corrigidas e combatidas. 

Quando começaram seus problemas na empresa? 

Sempre fui considerado um profissional exemplar, cheguei a técnico sênior ainda muito jovem, topei na carreira há mais de 15 anos, mesmo assim mantive o entusiasmo. Certo dia, perguntei ao gerente local se era justo trabalhar e sequer ser apontado o meu dia de trabalho. Fui defenestrado, desrespeitado. Comecei a pensar duas coisas que foram determinantes para uma tomada de posição, que culminou com a fase mais difícil da minha vida. Primeiro, o país tem uma lei cruel, injusta e perversa que se chama fator previdenciário, tal lei pela sua fórmula matemática empurra pouco a pouco o aposentado para a mendicância. Segundo, como posso trabalhar na maior empresa da America Latina, a quarta maior do mundo em energia, tendo a clareza e observando as injustiças a mim acometidas por ocasião do meu regime extremo de trabalho e a supressão de direitos sociais e trabalhistas que não vinham sendo pagos pela empresa, notadamente a subtração de horas extras (tanto inter quanto extrajornada), ingressei com a ação judicial n.º 100200-86.2011.5.21.0012 (Segunda Vara do Trabalho de Mossoró/RN) para fins de postular os meus respectivos direitos. Aí se iniciou um inequívoco processo orquestrado de perseguição. 

Você se considera vítima de violência no local de trabalho, aquilo que costumamos chamar de assédio? 

Indubitavelmente. Poderia citar várias situações além do rigor excessivo aplicado. Darei apenas dois exemplos, cristalinos e elucidativos: Pois bem, no dia 21/12/2011, quarta feira, as 08h20min, dia do embarque, fui convocado para comparecer à sala do gerente local. Aí começou o massacre e a verborragia descontrolada e assim foi dito pelo dirigente: “por causa da ação trabalhista das horas extras eu vou destruir você, vou acabar com você, eu posso tudo, tenho todo poder e faço o que bem entendo e além do mais ai de você se for à faculdade de Medicina fazer provas. A partir de hoje você deve ficar na base de 06h00min as 18h00min. Vou desfazer esta ação porque não vai dá em nada, a Petrobras desmancha a ação com facilidade” Coincidentemente era a semana de provas na UERN e fiquei transtornado pela virulência e ameaças que sofri. Ao sair da sala de hostilizações tive uma crise de nervos e de choro presenciado por Sóegima Cristina e Valdenildo. São público e notório que ninguém do sobreaviso nunca foi obrigado a permanecer na base durante 12h, uma vez que o trabalho é eminentemente no campo. 

No segundo exemplo, no dia 05/03/2012, numa reunião em Natal, às 10h20min, houve uma reunião do Gerente Regional com o Sindicato dos Petroleiros para tratar de assuntos relativos a perseguições e agressões nas relações de trabalho. Estava presente o Gerente dos Recursos Humanos. Os diretores sindicais Márcio Dias, José Araújo (Dedé), Pedro Idalino e Belchior, além dos empregados da Petrobras Décio, Hélio, Jaime, Soégima Cristina e Valdenildo. O Gerente Regional reforçou os desatinos do Gerente local, foi extremamente duro e cruel. A angústia que já vinha sofrendo, a depressão devidamente diagnosticada, aumentou com a insensibilidade daquele Gerente e a dor doeu mais forte, saí da reunião em completo desatino porque de dedo em riste e na condição de ser proibido de falar, de forma ríspida e autoritária foi dito: “Hélio, você vai ficar no administrativo porque eu quero, e quem vai buscar conhecimento em área que não é de interesse da empresa, eu não tenho compromisso e o ônus é todo do empregado.” Reconheceu que em toda Petrobras sobrara dinheiro no ano de 2011 e disse textualmente que tinha a missão de lapidar o gerente local. 

O que o assédio sofrido já lhe trouxe de consequências pessoais, profissionais e de saúde? 

O assédio moral foi devastador em minha vida. Passei, em dezembro, da condição de um feliz e vibrante acadêmico de Medicina para um paciente com necessidades de fazer uso de ansiolíticos e antidepressivos já no mês de fevereiro, adoeci gravemente, deixei de freqüentar as aulas, perdi todas as disciplinas. A depressão se acentuou e imuno deprimido, tive a infelicidade de ser acometido de dengue hemorrágica, fui internado na UTI do Hospital Português, tive uma experiência de morte. Os problemas são muitos: sofro de transtorno ansioso-depressivo, severo distúrbio do sono, dores de cabeça dilacerantes, inapetência, perda de peso, diminuição da libido e diminuição da eficácia do sistema imunológico. O que tanto afeta meus amigos e fundamentalmente a minha esposa, meus três filhos é o desinteresse e o isolamento social. Digo, a depressão é malvada, quem já passou por isso sabe muito bem do que estou falando. Na foto que você vai publicar os leitores podem ver o estado de saúde a que cheguei, evidentemente, não me conformo com isso. Reduziram meu salário cerca de 40% e mudaram meu regime de trabalho do campo, onde sou especialista para o administrativo. Tenho sentimento de indignação e ponho minha esperança em Deus e na justiça, que sabiamente não terá dificuldades de equacionar a problemática. 

E a justiça? O que ela já disse do seu caso? 

Bem, acredito na justiça do meu país, a minha ação trabalhista tem forte embasamento. O juiz para bem decidir precisa de provas, as minhas são incontroversas, incontestáveis e insofismáveis, não tenho dúvidas disso. Caso ocorra uma análise bem feita, não haverá a mínima dúvida de que trabalhei em regime excessivo, por que não dizer como uma espécie de semi-escravidão. Com sobrecarga de trabalho e com as folgas desrespeitadas, inclusive nas férias. Tudo isto, sem o pagamento devido. Diga-se da passagem que a Petrobras em sua essência não concorda com isto, o problema é localizado, regional. Estou entrando com uma ação de assédio moral que é de estarrecer e causar espanto em qualquer um pelo puro desrespeito ao acordo coletivo e próprio código de ética da empresa. Repito, confio na justiça, há homens de bem em todos os lugares e o mal será de alguma forma reparado. Em termos de sentença das ações de horas extras proferida pela justiça trabalhista duas dentre as quatro já foram julgadas favoráveis, as outras duas estão em tramitação. Quanto à ação de assédio acredito que ela é de uma clareza solar e assim sendo, espero um posicionamento favorável do magistrado. 

Há outros colegas em situação semelhante? 

Sim. Não obstante, não foi apenas eu quem ingressou com a medida judicial em disceptação. Diversos outros colegas, sentindo-se injustiçados com o não pagamento das horas extras em foco, assumiram a mesma postura e vêm pleiteando judicialmente o pagamento de suas jornadas extraordinárias. Agora, sou o bode expiatório, como sempre acontece na história da humanidade. Há seis colegas extremamente afetados, todos passam por tratamentos psiquiátricos, diga-se de passagem, com profissionais médicos diferentes. O que não é coincidência são os diagnósticos e o tratamento, uma vez que todos estão tomando medicação com tarja preta (antidepressivos e ansiolíticos). São eles: Décio (depressão crônica e sem avanço com o tratamento); Jaime, Hollanda, Sóegima Cristina e eu. 

Qual a sua expectativa? O que você espera que possa acontecer nesse caso? 

Primeiramente a minha maior expectativa é ver a minha saúde ser restabelecida. A mudança do regime de sobreaviso foi para inviabilizar a minha freqüência no curso, que é o sonho da minha infância. Estando em sobreaviso, poderia comparecer em tempo integral na faculdade nos dias que estava de folga. Em regime administrativo sou obrigado a trabalhar todos os dias, justamente nos horários em que se desenvolvem as aulas da Faculdade de Medicina. A inviabilidade de consensualização do horário de trabalho novo com as obrigações do curso é evidente. Dito isto, sonho em poder voltar a estudar Medicina na UERN; ver a justiça erguida e fundamentalmente que práticas perversas como estas não venha ocorrer com nenhum outro trabalhador. Que as gerações futuras na companhia tenham o prazer de dedicar-se com afinco e zelo e por isso ser reconhecida, e não castigada como está sendo no meu caso. Visto que a pior dor é a da alma, a depressão é malvada e insiste em não ir embora justamente porque estou levando uma vida a qual não suporto, pois não há como agüentar ver a minha decência e dignidade ser subtraída pela arrogância e insensibilidades de uns poucos. 

Fique à vontade para dizer mais alguma coisa. 

Constata-se que o assédio moral é prática odiosa, cometida pelo superior hierárquico ou colega de trabalho, que fragiliza o trabalhador assediado e o expõe a doenças de ordem psíquica e física. A vítima, não raro, é levada a pedir demissão e, em casos mais graves, chega até a cometer o suicídio.

Os prejuízos desses afastamentos para a empresa tendem a ser ainda mais danosos quando o assediado é um empregado especializado na sua atividade, devido à maior dificuldade em sua substituição.

Quando não está afastada do trabalho para tratamento de saúde (como é o meu caso), a vítima do assédio moral trabalha com medo, estressada, abatida, confusa, intranqüila, insegura, sem possuir, portanto, as condições ideais para que desempenhe adequadamente as suas funções.

Esse quadro adverso afeta o trabalhador e reduz a sua produtividade. Particularmente, na noite anterior ao trabalho os remédios não surtem efeitos, não consigo dormir e são fortes as dores de cabeça.

Os efeitos danosos para a sociedade não param por aí. O assédio, ao debilitar a saúde física e psíquica da vítima, aumenta a demanda por benefícios previdenciários pagos pelo INSS.

Como vimos, a prática odiosa do assédio moral provoca efeitos danosos às empresas e à sociedade, a par daqueles ainda mais graves causados à saúde dos trabalhadores que dele são vítimas.

Conseqüentemente, deve ser combatido, de modo contundente, por toda a sociedade e pelo estado.

OS INTERESSES DO BRASIL E O NOVO PLANO DE NEGÓCIOS DO SISTEMA PETROBRAS

Por Divanilton Pereira

No dia 14 de junho deste ano a Petrobras apresentou a atualização anual para o seu plano de negócios 2012-2016. Em torno dele, geraram-se muitas discussões, especulações e disputas políticas dentro e fora da empresa. Não à toa, pois se trata da primeira exposição pública da elaboração estratégica da nova presidenta, Graça Foster. Um foco que envolve volumosos investimentos e com múltilplos interesses envolvidos.

 

UMA SITUAÇÃO INTERNACIONAL TENSA E INCERTA

Além dessa circunstância sobre os rumos da nova gestão, esse plano atualiza-se sob os efeitos universais da mais perversa crise capitalista contemporânea. No Brasil, apesar de medidas governamentais, ela já repercute negativamente sobre o ritmo do crescimento produtivo. No entanto, ao mesmo tempo em que agride um padrão civilizacional laboral, sobretudo o da Europa, ela acelera a nova configuração geopolítica multipolar ora em curso.

Nesse contexto, um conjunto de decisões sobre investimentos do porte do proposto por uma empresa do Brasil joga um papel importante na nova divisão internacional do trabalho.

O MAIOR APORTE DE INVESTIMENTO DE UMA EMPRESA OCIDENTAL

O plano atualizado apresenta um volume de investimentos de U$ 236,5bilhões (R$ 416,5 bilhões) para o novo qüinqüênio, uma média de U$ 47,3 bilhões por ano. O anterior (2011 -2015)

previa U$ 224,7 bilhões. Adicionam-se a esse novo montante U$ 34 bilhões das empresas parceiras da Petrobras na área do E&P, totalizando U$ 270,5 bilhões.

Entre todos os segmentos próprios do sistema estatal e em relação ao PN anterior, o setor da exploração e produção cresceu e prevê consumir 60% do investimento total (U$ 141,8 bilhões). Com pequenos acréscimos, o do Gás &Energia, Petroquímica, Distribuição e o Corporativo foram respectivamente para U$ 13,8, U$ 5,U$ 3,6 e U$ 3,0 bilhões. Já o do refino, transporte e comercialização – um complexo com importante papel na agregação de valor dessa cadeia produtiva – teve seu aporte reduzido em 27,7% (U$ 65,5 bilhões), e o dos biocombustíveis para U$ 3,8 bilhões.

O plano revisa a produção de petróleo (boe) para 4milhões e 200mil barris por dia (mbpd) em 2020, contra a projeção anterior de 4.910 mbpd para o mesmo período. Uma redução de 14%.

AJUSTES OU NOVA ESTRATÉGIA?

Das várias rubricas do plano, destaco a denominada “projetos em avaliação”, um “colchão” que pode chegar até U$ 27,8 bilhões. Os que se enquadram nessa categoria são os projetos que ainda são passíveis de estudo de viabilidade econômica (EVTE), que, somente quando superada essa fase, ganharão a condição para suas execuções. A refinaria do Maranhão, a do Ceará e a da COMPERJ estão aí incluídas, portanto, sob reanálise. Outra é a dos desinvestimentos, uma conta que não explicita quais segmentos serão impactados e que cresceu para U$ 14,8 bilhões.

A nova gestão sustenta essa revisão em função – segundo ela – dos erros de foco, operacionais e de controle da gestão anterior. Por mais publicamente que tente agora a presidenta minimizar essas suas conclusões, a cada exposição desse novo PN pelos seus técnicos e/ou por leituras mais atentas, está claro que há uma reorientação estratégica nos investimentos da Petrobras.

Esse novo PN – atualmente–não significa uma alteração de rumo, pois os volumes de investimentos nele contidos expressam uma orientação política governamental que ganhou impulso desde Lula e prevalece com a presidenta Dilma. Tanto que mais uma vez mantém a tendência de crescimento dos aportes previstos dos últimos planos. A questão da exigência do conteúdo nacional é também um dos traços marcantes dessas recentes diretrizes.

Entretanto, a depender da estratégia adotada, ela pode aproveitar parcialmente ou plenamente a capacidade indutora e multiplicadora desses investimentos. Essas fabulosas cifras podem e devem contribuir para o financiamento de um novo padrão do desenvolvimento brasileiro. Mas analisando alguns valores e conceitos que sustentam a atualização desse plano, eles podem reduzir os efeitos potenciais para que alcancemos esse objetivo.

A TECNOCRACIA É UMA CORTINA DE FUMAÇA

Quando pela primeira vez em nossa história, forças oriundas do meio popular e democrático ocuparam os principais postos de comando do Estado brasileiro, alguns extratos da elite de outrora reagiram e até hoje se contorcem com essa vitória popular.

Aparelhismo partidário, abandono da meritocracia, interferência política na gestão das empresas estatais, etc. Foram e são até hoje o mote político dessa parcela do conservadorismo brasileiro contra o atual projeto político em curso no país.

A Petrobras está inserida também dentro desse contexto, e o que aparentemente tenta-se mostrar como mais uma questão técnica – como o novo PN – nada mais é do que a expressão concreta de mais uma disputa de interesses.

Por que será que essas mesmas vozes – dentro e fora da empresa – com destaque para a grande mídia, deram tanto destaque, inclusive defendendo as medidas do novo modelo da presidenta Graça Foster? Será que se tornaram defensores da soberania nacional?

Nós que integramos o pensamento classista no Brasil defendemos o esmero e a viabilidade dos negócios púbicos. Ajustes, correções de foco e de gestão são aperfeiçoamentos sempre bem-vindos, entretanto, consideramos inadequado que se utilizem discursos tecnocratas para tentar justificar novos projetos. Na Petrobras alguns segmentos que estavam afastados de alguns postos de comando – mas suas idéias sempre circularam – aproveitam-se da situação criada e tentam retomar a iniciativa política.

A QUEM INTERESSA UM BRASIL EXPORTADOR DE ÓLEO CRU?

A rentabilidade do segmento do refino em nível mundial está em baixa, e no Brasil não é diferente. Tanto é verdade, que rareiam as construções de refinarias.

No Brasil, após várias décadas, novas instalações foram aprovadas e algumas estão em obras. Uma decisão estratégica importante, pois possibilita agregarmos valor à produção petrolífera. À época, foi decisiva a visão nacional do Presidente Lula em detrimento daqueles que só se orientam pela lógica rentista do mercado.

Como vimos, esse novo PN projeta uma queda de investimento nesse segmento e eleva o da exploração e produção. O foco no E&P tem sua lógica, mas não podemos encará-lo – assim defendeu um dos expositores da empresa –como sendo mero arrecadador para que só posteriormente possa viabilizar a nossa capacidade refinadora. Esse argumento não se aplica a uma empresa integrada como é a do sistema Petrobras.

Como resultante dessa visão, as refinarias do Maranhão, Ceará e do complexo da COMPERJ estão inseridas no plano sob a rubrica “Em Avaliação”. Essa decisão obrigou a presidenta a receber os governantes desses estados e confirmar as obras previstas. No entanto, não saiu nenhum “fato relevante” alterando o plano e oficializando essa promessa.

O SISTEMA “S” PODE CONFLITAR OS INTERESSES NACIONAIS E O DOS ACIONISTAS

São uníssonas as vozes do pensamento nacional que o Brasil não deve continuar a ser uma mera economia exportadora primária. E, portanto, não podemos repetir erros de outras nações e nos constituir num grande exportador de óleo cru. Provavelmente o retorno financeiro estaria assegurado, mas para quem? Que tipo de desenvolvimento teria o nosso país? Para quem interessaria esse tipo de estratégia?

Penso que essa parte do plano de negócios 2012-2016 é um diálogo com esse tipo de pensamento rentista, que só leva em consideração os fatores econômicos e financeiros em detrimento do progresso da nação. Essa estratégia pode até servir aos bolsos dos acionistas privados e seus aliados, mas é um obstáculo à causa contra as desigualdades regionais e pelo novo desenvolvimento brasileiro.

São visíveis os erros encontrados pela nova gestão da Petrobras, mas nenhum deles justifica uma alteração na estratégia em pontos tão nevrálgicos da empresa.

A FORÇA DE TRABALHO

Diante de todo o diagnóstico realizado pelo novo plano, a parte dedicada aos trabalhadores e as trabalhadoras foi apenas uma tela que expressa maiores exigências disciplinares, num desnecessário apelo ao engajamento da categoria às novas metas. Além disso, um dos seus programas estruturantes proclama a “Otimização dos Custos Operacionais”. A categoria, que já sofre com os abusos morais,e já tarimbada sobre quem repercutirá tal diretriz, prepara-se para uma nova ofensiva que o trabalho sofrerá com a nova gestão da Petrobras.

Mãos à obra.

Divanilton Pereira é Potiguar e Técnico de Petróleo.

Membro do Comitê Central do PCdoB

Membro da Direção Nacional da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) e da Federação Única dos Petroleiros.

Democratização da comunicação na pauta dos petroleiros durante a III Plenafup

Jornalistas Fernando Morais e Leonardo Severo debaterão seus livros com os trabalhadores

Com o tema “A energia a favor dos povos, com justiça social e ambiental”, a III Plenária Nacional da FUP (Plenafup) será realizada em Porto Alegre, entre os dias 02 e 05 de agosto. O evento reunirá na capital gaúcha cerca de 200 petroleiros e petroleiras eleitos nos congressos e plenárias regionais, além de observadores, convidados e assessores. Os trabalhadores irão deliberar sobre conjunturas política e econômica, organização sindical, pautas de reivindicações da categoria, estratégias e planos de luta.

Antes da solenidade de abertura da III Plenafup, prevista para as 19 horas do dia 02, haverá um debate sobre democratização da comunicação, com participação de jornalistas e militantes. Foram convidados para o evento os jornalistas e escritores Altamiro Borges, presidente do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, Leonardo Severo, assessor da CUT nacional e redator do jornal Hora do Povo, Leandro Fortes, repórter especial da revista Carta Capital e professor da Escola Livre de Jornalismo, e Fernando Morais, autor de “Os Últimos Soldados da Guerra Fria”, “Olga”, “A Ilha”, “Chatô”, entre outros livros-reportagem.

Os jornalistas irão debater temas como manipulação e partidarismo nos veículos de comunicação, liberdade de expressão, a influência das redes sociais e dos blogs como mobilizadores e formadores de opinião, entre outras questões. O debate sobre democratização da comunicação está previsto para ocorrer entre às 14 e 18 horas. O evento será realizado no Salão de Convenções do Hotel Embaixador, situado à Rua Jerônimo Coelho, 354, Centro de Porto Alegre.

Tarde de autógrafos com Fernando Morais

Os jornalistas Fernando Moraes e Leonardo Severo irão debater seus últimos livros com os petroleiros e convidados durante a III Plenafup. Fernando Moraes irá autografar e comentar  “Os Últimos Soldados da Guerra Fria”, que narra a história dos agentes secretos cubanos infiltrados em organizações de extrema direita dos Estados Unidos e revela os tentáculos de uma rede terrorista com sede na Flórida e ramificações na América Central, apoiada pelo governo norte americano e membros do Poder Legislativo e Judiciário. A cerimônia será durante o debate sobre democratização da comunicação, na tarde do dia 02, no Salão de Convenções do Hotel Embaixador.

Leonardo Severo lança a segunda edição de “Latifúndio Midiota”

No dia 03, antes da votação do regimento e da mesa diretora da Plenária Nacional da FUP, o jornalista Leonardo Severo, fará o lançamento nacional da segunda edição do seu livro “Latifúndio Midiota”, que denuncia os crimes, crises e trapaças da dita “grande imprensa”. A primeira edição do livro foi lançada também em Porto Alegre, em janeiro, durante o Fórum Social Mundial. Desde então, Leonardo tem corrido o pais, debatendo com trabalhadores, estudantes e movimentos sociais a importância da democratização da comunicação. Seu livro é mais um importante instrumento de luta e mobilização por um novo marco da comunicação no Brasil. O lançamento da segunda edição de “Latifúndio Midiota” será às 10 horas do dia 03, no Salão de Convenções do Hotel Embaixador.

Livro resgata atuação da CUT nas eras Lula e Dilma

Artur Henrique, presidente da Central, sintetiza as principais lutas e desafios nos últimos seis anos em CUT: um olhar de 2006 a 2012

São Paulo – O 11º Congresso Nacional da CUT (Concut) encerra o período em que Artur Henrique esteve à frente da maior central sindical do país. Técnico eletrotécnico, sociólogo de formação e sindicalista por vocação, Artur assumiu a presidência da entidade em 2006.

Leia a íntegra do livro

“Não fizemos tudo o que queríamos, mas fizemos muito para mostrar que a CUT continua sendo o principal instrumento de luta e organização da classe trabalhadora do Brasil”, destacou Artur Henrique, ao apresentar o balanço da gestão. “Isso é obra da classe trabalhadora unida, refletida neste 11º Concut, que representa mais de 22 milhões de trabalhadores de todo o país”, ressaltou.

Foram seis anos de mobilizações, negociações, certezas e incertezas, como aponta o livro CUT: um olhar de 2006 a 2012, lançado neste 11º Concut, e no qual Artur analisa e sintetiza os principais avanços e desafios da Central nessas duas últimas gestões.

A luta pela implementação da política de valorização do salário mínimo, pelo fim do fator previdenciário, contra as privatizações e pela aprovação da PEC do Trabalho Escravo são alguns dos muitos episódios que fazem parte da história recente da CUT.

Essas passagens e outras análises sobre o período podem ser conferidas no livro. “Isso é um pouco do que tentaremos mostrar por meio deste balanço, com olhar crítico e possível a quem discorre sobre a si mesmo, e com incontornável orgulho de quem uniu sensibilidade, argúcia e solidariedade em nome de ideais que o tempo vai confirmando como justos e fraternos”, diz trecho.

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Documentarista chileno Patrício Guzmán fala sobre o golpe contra Allende e a ditadura de Pinochet. “Os países sem memória são anêmicos e conformistas”

Carta Maior

Em entrevista à Carta Maior, o documentarista chileno Patrício Guzmán fala sobre o golpe contra Allende e a ditadura de Pinochet. E faz uma apaixonada defesa da memória: “Os países que praticam a memória são mais vívidos, mais criativos, fazem melhores negócios, melhor turismo, são mais distintos. Os países sem memória são anêmicos, não se movem, são conformistas, e caem numa espécie de cultura de sofá, gente que está sentada no sofá assistindo a televisão… E não se movem. Acredito que a memória é um conceito tão importante quanto a circulação do sangue”.

Em entrevista à Carta Maior, o documentarista chileno Patrício Guzmán fala sobre as relações entre a direita e a esquerda no periodo do golpe contra o presidente Salvador Allende em 1973 e as medidas tomadas pelo ditador Augusto Pinochet para tentar apagar da história a memória do presidente deposto.

Durante a exibição de seu filme “Nostalgia da Luz” que fechou o evento “Memória e Transformação”, promovido pelo Instituto Vladimir Herzog e Cinemateca Brasileira, Guzmán falou sobre a importância e necessidade da memória, como instrumento politico de identidade do país e de seus indivíduos. Sua obra, segundo ele, é permeada pela tensão entre memória e esquecimento.

Conhecido por seus filmes sobre o Chile, os anos Allende e o golpe militar de Pinochet, o documentarista, também falou sobre o movimento estudantil chileno, que em suas palavras, “quer não só melhor educação, mas uma sociedade mais humana”. Guzmán ainda falou sobre a mídia e o papel vital do documentário na história de uma nação, “um país sem documentário é como uma família sem álbum de fotografias”.

Veja acima vídeo com a entrevista e, abaixo, a transcrição da fala de Guzmán.

“Eu cheguei muito tarde na política, quero dizer, que quando fui para Espanha para estudar Cinema não tinha uma posição clara. Eu queria mudança, não a mudança radical. Era, se preferir, uma pessoa neutra. Eu me conscientizei estando em Madri, porque a ditadura franquista estava vivendo seus últimos momentos e a Escola del Cine estava no meio da faculdade de Ciências Políticas, de História e Filosofia para chegar até a faculdade tinha que atravessar o campus e via os policiais em confronto com os estudantes, digamos que estávamos em meio um campo de guerra urbana, portanto, foi dentro da faculdade que comecei a entender o que estava passando na América Latina.

Nesse espaço de cultura efervescente que comecei a ter uma consciência mais forte. E quando Allende saiu, eu disse a mim mesmo “tenho que voltar imediatamente, não posso ficar aqui”. Cheguei tarde, cheguei tarde. 4 meses depois que Allende já tinha tomado o poder. Então, os postos já estavam todos ocupados e como não era militante tinha menos possibilidade. Então fui até a escola de Cinema onde tinha estudado no Chile, e disse ao diretor : “O que está passando é tão bonito, tão extraordinário, há uma efervescência tão grande, uma participação massiva enorme que temos que filmar. Imediatamente”

Tratava-se que Allende tinha que renovar o parlamento e a direita queria destituí-lo. A direita pensava que ao obter 60% dos votos e com isso podiam destituir o presidente… Então saímos às ruas e filmamos imediatamente, porque não podíamos não filmá-lo. Bom, Allende conseguiu 43, 44%, ou seja, conseguiu a mais alta votação depois de dois anos de desgastes de um governo chileno. E não puderam destituí-lo, a partir daí a direita entende que precisa dar um golpe de estado, que já não se pode tirar pela via legal um governo popular. E aí eu parei, deixei de filmar e nos reunímos.

Fizemos uma semana de reunião para estabelecer um método de trabalho. Pusemos, fizemos um esquema em cartolinas com os principais problemas, divididos em políticos, ideológicos e econômicos, que é uma análise marxista elementar, então colocamos muitas chaves com tudo o que derivava dali. Se era economia, era a nacionalização das riquezas básicas, a fábrica, a produção, a batalha da produção. Se era ideologia: as rádios, as televisões, os novos partidos da direita etc. E no outro lado, outro esquema íamos colocando o que filmávamos e comparando uma coisa com a outra. O resultado foi um filme com muitos contra-pontos, digo, a uma ação da esquerda uma resposta da direita. A um contra ataque da direito outra resposta da esquerda, o qual era um documentário ideal. Digamos… que haja um diálogo de contrários, se não há diálogo de contrários não existe linha de desenvolvimento. O filme fica monótono.

Era tal a aceleração da história que Allende produziu, e tal a quantidade de acontecimentos que passava que você acreditava que estava vivendo em um caos total.

Digamos que tínhamos que filmar dois rolos (de filme) diários, essa era minha divisão, se de repente sobrava, então teríamos 3 para o próximo dia. E se no terceiro dia havia outro dia ruim, teríamos 4 para uma boa sequência. E assim fomos equilibrando a tal ponto que quando veio o Golpe de Estado só nos sobraram dois rolos, ou seja, quando se acabou o filme, acabou-se o projeto político. Isso foi muito curioso.

O Chile dos anos 70, o Chile Allende é um dos países mais cultos politicamente que existiu na América Latina, com um desenvolvimento, um amadurecimento da esquerda insólito, com um partido comunista de quase cem anos, partido socialista igualmente velho, uma social-democracia avançada,uma esquerda radical interessante e uma leitura política entre os trabalhadores e estudantes alta.

Depois da repressão de Pinochet não ficou nada.

E os dezoito anos de completa amnésia, Pinochet quis fazer tábula-rasa, apagou a história, apagou Allende da história e transformou comunismo, demonizou o comunismo a graus grotescos. Insultou Allende de todas as maneira que quis, disse tudo o que lhe passou na cabeça contra Allende. Quase tudo falso. E deixou o país, portanto, como que em uma espécie de deserto de memória, de recordações políticas até hoje. De tal maneira que a única coisa que temos é um movimento estudantil magnífico, é a quarta geração que já não tem medo, são inteligentes, querem ir adiante, são contestadores e querem não só melhor educação, mas também querem melhor saúde, melhor moradia, melhores condições de trabalho, melhor vida, uma sociedade mais humana. Não lutam só pelos seus.

Mas só dependemos deles, digamos que não há nenhum outro grupo da sociedade que esteja em plano de luta frontal contra a amnésia, contra os torturadores que andam soltos, contra uma justiça lenta, contra uma Constituição que todavia tenha inimigos internos que é um conceito que causa divisão e ódio, contra uma constituição que fala que os mapuches (etnia indígena) são terroristas. Então, há muito coisa a fazer.

A televisão nasceu como o meio mais importante e pedagógico do século XX e foi convertido em um terrorismo áudio-visual espantoso, nossa televisão latino-americana é imoral e insuportável.

Acredito que a memória não é um conceito intelectual, não é um conceito universitário, não é um conceito acadêmico. A memória é completamente dinâmica, digamos, está dentro do nosso corpo. Os países que praticam a memória são mais vívidos, mais criativos, fazem melhores negócios, melhor turismo, são mais distintos, são melhores. Os países sem memória são anêmicos, não se movem, são conformistas, e caem numa espécie de cultura de sofá, gente que está sentada no sofá assistindo a televisão… E não se movem. Acredito que a memória é um conceito tão importante quanto a circulação do sangue.

Existe uma historiografia científica na América Latina que se pode chamar de moderna? Não. Foi a classe alta que escreveu a história a seu próprio gosto, como no Chile. Eu não acredito em nenhum herói chileno. Não acredito em nenhum deles. Tenho certeza que nos mentiram sistematicamente. Como nos mentiram sobre Allende, sobre Balmaceda, sobre tantos outros heróis que tivemos no Chile.

Tem que se começar apoiando uma nova geração de historiadores que revisem o que passou de um ponto de vista moderno… para estabelecer as bases onde nos apoiaremos e ter um plano de fundo de verdadeiros heróis para seguir adiante. Assim como a ecologia não se conhecia há 30 anos, os direitos das mulheres não eram conhecidos, ou não eram respeitados, há 70 anos… Assim como os direitos dos indígenas ou a liberdade sexual não eram reconhecidos.. Hoje em dia a memória chegou ao mundo contemporâneo para ficar. Não é passageira, já está instalada. E vai ficar até que nós mesmos a desenvolvamos. É fundamental.

O documentário é um direito do cidadão. Assim como há um dever público em prover saneamento básico, tem que haver documentários, por lei, por obrigação. É o registro de um país, é o álbum de fotos de um país.



 

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